Sobre as Indulgências

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Entre os tantos tesouros espirituais que a Santa Mãe Igreja guarda com zelo, talvez um dos mais mal compreendidos, tanto fora quanto dentro da Igreja, sejam as indulgências. Há quem pense que se trata de uma “licença para pecar”, outros acham que é uma forma de “comprar” o céu, e há ainda quem pense que isso é coisa do passado, como se tivesse sido abolido em algum concílio ou deixado de fazer sentido para o tempo presente. Mas a verdade, quando conhecida à luz do ensinamento da Igreja, nos mostra o quanto as indulgências são expressão do infinito amor misericordioso de Deus por nós.

Para conseguirmos entender bem precisamos voltar ao básico da catequese que muitos de nós ouvimos na infância e relembrar, o que é uma indulgência?

O Catecismo da Igreja Católica, no parágrafo 1471, nos ensina que, “a indulgência é a remissão, diante de Deus, da pena temporal devida pelos pecados já perdoados quanto à culpa”.

Ou seja, as indulgências não são um “perdão de pecado”, isso é obra exclusiva do sacramento da confissão. Mas sabemos que, mesmo após a confissão, permanecem em nós penas temporais, feridas da alma que precisam ser purificadas. As indulgências agem aí, são como um bálsamo espiritual aplicado por Deus, por intermédio da Igreja, para sanar o dano que o pecado causou em nós e no mundo.

O Papa São Paulo VI, na Constituição Apostólica Indulgentiarum Doctrina (1967), recorda que, “a doutrina e o uso das indulgências na Igreja têm apoio sólido na Revelação divina, que provém dos Apóstolos e ‘se desenvolve na Igreja sob a ação do Espírito Santo’”.

E por que a Igreja tem esse poder? Porque a ela foi confiado o Tesouro dos Méritos de Cristo e dos Santos, frutos da Cruz e da vida virtuosa dos que se uniram plenamente ao Senhor. Esse tesouro, diz o Papa São Paulo VI, é a base sobre a qual a Igreja, como mãe, administra com prudência e caridade os bens espirituais para a salvação dos seus filhos.

Mas, para que servem as indulgências? A indulgência cura, fortalece e educa a alma. Ajuda-nos a desapegar-nos do pecado, incentiva-nos a realizar obras de misericórdia, oração e penitência, fortalece o vínculo com a Igreja e nos prepara para a bem-aventurança eterna. E mais: as indulgências podem ser aplicadas a nós ou a uma alma do purgatório, como expressão de caridade sobrenatural.

Como nos ensina o Catecismo (n. 1479), “através das indulgências, os fiéis podem obter para si mesmos e também para as almas do purgatório a remissão das penas temporais”.

Isso significa que, ao ganhar uma indulgência, você pode oferecê-la por um ente querido falecido. Assim, cooperamos com a Igreja triunfante e a Igreja padecente, na grande comunhão dos santos. Como dizia São João Maria Vianney, “se soubéssemos o valor das almas do purgatório, passaríamos a vida intercedendo por elas”.

Agora você pode estar pensando, também quero, mas como se consegue uma indulgência?

A Igreja concede indulgências parciais (remissão de parte da pena temporal) e plenárias (remissão total). Para obter uma indulgência plenária, são necessárias quatro condições ordinárias: A confissão sacramental, dentro de alguns dias antes ou depois da obra indulgenciada; a comunhão eucarística, em estado de Graça, sempre!; a oração nas intenções do Santo Padre o Papa; e o desapego total de qualquer pecado, mesmo venial.

Sem essa última condição, a indulgência, embora buscada com devoção, será apenas parcial. Caso não consiga realizar as quatro, não perca a esperança: a graça parcial ainda será concedida, e Deus, em sua infinita misericórdia, faz frutificar cada esforço sincero.

As obras mais conhecidas que trazem indulgência plenária são Adoração ao Santíssimo Sacramento por pelo menos 30 minutos; Leitura da Sagrada Escritura por pelo menos 30 minutos; Rezar o Santo Rosário em família, em grupo, ou diante do sacrário; Caminhar a Via-Sacra; Renovar as promessas do batismo durante a Vigília Pascal ou no aniversário do batismo; Participar devotamente da bênção papal “Urbi et Orbi”.

Mas existem muitas maneiras de se lucra uma indulgência e é possível encontrar informações sobre elas no Manual das Indulgências Normas e Concessões que foi aprovado pela Santa Sé e publicado pela CNBB em parceira com a Editora Paulus, cujo qual eu recomendo a leitura atenta. 

Não a fim de trocar erros por acertos, mas como um ato de reaproximação com Deus, como bem recordou o papa Bento XVI em sua homilia na Quaresma de 2008, “as indulgências não são uma barganha com Deus, mas expressão da ternura do Pai que, por meio da Igreja, quer nos ajudar a curar os efeitos do pecado”.

Mas por que muitos católicos não conhecem ou rejeitam as indulgências? Talvez por ignorância. Talvez por trauma histórico. Talvez porque a prática foi, sim, mal compreendida em certos momentos da história e usada de modo indevido, como reconhece a própria Igreja nos documentos do Concílio de Trento. Mas não se abandona a medicina porque um charlatão usou de má-fé, e não se nega a verdade porque alguém a distorceu. O que é verdadeiro, bom e santo permanece como herança da Igreja e precisa ser resgatado com clareza.

Por que as indulgências são importantes para a nossa vida espiritual e nossa salvação? Porque apontam para a justiça e a misericórdia de Deus, que nos quer purificados para o céu. Porque nos ajudam a compreender que o pecado tem consequências reais, mas que a Graça também tem poder real. Porque nos convida a viver a comunhão dos santos, a oração pelos outros, a caridade como caminho de salvação.

Como dizia Santo Afonso Maria de Ligório, “quem reza por uma alma do purgatório com verdadeiro fervor, pode ter a certeza de que encontrará um intercessor no céu”.

E como nos lembra a sabedoria da Santa Mãe Igreja, a indulgência não é um atalho, mas um auxílio. Não dispensa a conversão, mas a impulsiona. Não substitui a santidade, mas nos educa a desejá-la.

Portanto, resgatemos com amor essa joia espiritual, deixada a nós pelo Senhor e confiada à Igreja. Estude as indulgências. Pratique-as com humildade. Ofereça-as com generosidade. Viva-as como expressão concreta de fé, penitência e amor.

Percebam Deus nos pequenos detalhes.

Graça, Paz e Misericórdia.