Convertei-vos, porque o Reino dos Céus está próximo (Mt 3, 1-12)
2º Domingo do Advento | Ano A

O segundo domingo do Advento nos conduz ao deserto, ali onde tudo é essencial e silencioso, ergue-se a voz de São João Batista, o último dos profetas e a ponte viva entre a Antiga e a Nova Aliança. É assim que a liturgia nos introduz ao núcleo da preparação para o Natal do Senhor, “Convertei-vos, porque o Reino dos Céus está próximo” (Mt 3,2). Toda autêntica espera de Deus passa necessariamente pela conversão, não como ato moral isolado, mas como transformação radical da existência.
São João Batista aparece no deserto como sinal e denúncia, que para Santo Agostinho, bispo e doutor da Igreja, ele é “a voz que serve à Palavra”, uma existência inteira voltada para apontar Aquele que vem. A vida austera de São João Batista não é mero ascetismo, mas uma pedagogia espiritual que nos recorda, como ensina São Gregório Magno, papa e doutor da Igreja, que “o coração que deseja ver a Deus deve desprender-se das vozes do mundo para escutar a voz do Alto”. Assim o deserto não significa fuga, mas clareza por ser o lugar onde o supérfluo se dissolve e a verdade se impõe.
A pregação de São João Batista é contundente, ela chama à conversão tanto os simples quanto aqueles que confiavam na segurança do sangue, da tradição ou da posição religiosa. Sua palavra corta como machado que toca a raiz (Mt 3,10), expondo as estruturas interiores que resistem à graça. São João Crisóstomo, arcebispo e doutor da Igreja, afirma que São João Batista não condena a descendência de Abraão, mas a presunção espiritual, porque “não basta ter bons pais se o coração permanece estéril diante de Deus”, e é assim que o tempo do advento nos faz perceber que ninguém está autorizado a colocar a salvação no piloto automático.
A imagem do “fruto digno de conversão” (Mt 3,8) aponta para uma fé que se torna visível e concreta. Santo Tomás de Aquino, o doutor angélico, comentando esta passagem, observa que a verdadeira contrição não permanece apenas no desejo, mas gera obras conforme a graça recebida. A conversão não é mero afeto religioso, precisa ir muito além, é decisão, mudança de direção, abertura para que Deus redesenhe o coração segundo seu próprio querer.
São João Batista também anuncia a identidade e a missão dAquele que vem, “Eu vos batizo com água para a conversão, mas aquele que vem depois de mim é mais forte do que eu (…) Ele vos batizará com o Espírito Santo e com fogo” (Mt 3,11). Aqui São João Batista se torna testemunha da novidade absoluta trazida por Cristo. O fogo do Espírito não destrói, purifica, não devora, transfigura. São Cirilo de Jerusalém, bispo e doutor da Igreja, recorda que o fogo divino “queima o pecado, mas ilumina a alma”, realizando o que a água por si só não pode fazer. Advento é justamente a abertura para essa operação interior da graça que nos prepara para acolher o Emmanuel.
A alegoria da pá, da eira e do fogo inextinguível revela a seriedade da missão do Messias, Bento XVI ensina que estas imagens não devem ser lidas com temor servil, mas com realismo espiritual, pois Cristo não vem para confirmar nossas zonas de conforto, mas para purificar o mundo e o coração humano. Ele separa o trigo da palha, mas não o faz por vingança, o faz por amor à verdade. O Advento, portanto, não é sentimentalismo e nem simbolismo litúrgico, é um tempo de decisão. A proximidade do Senhor exige de nós vigilância e sinceridade, pois nada permanece escondido ao olhar daquele que discerne as intenções.
O deserto de São João Batista ecoa ainda hoje e cada um de nós é convidado a entrar nesse espaço interior onde a Palavra ressoa com nitidez. E ele nos lembra que a verdadeira preparação consiste em oferecer a Deus um coração limpo e obediente. Se permitirmos que a voz profética de São João Batista desestabilize nossas seguranças, provocando conversão e humildade, então o caminho será aberto para que Cristo encontre morada em nós.
Neste segundo domingo do Advento, a Santa Mãe Igreja nos chama a caminhar até o deserto, ouvir a voz que prepara, acolher o fogo que purifica e gerar frutos que revelem o Reino. Que nossa conversão seja real, profunda e alegre, porque o Senhor está perto, e feliz é aquele cujo coração Ele encontra pronto, reconciliado e vigilante.
Percebam Deus nos pequenos detalhes.
Graça, Paz e Misericórdia.




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