Eu sou suspeito para falar de Os Simpsons porque cresci assistindo essa série animada e até hoje facilmente ela entra na minha lista de preferidas, em 2007 a série animada lançou um filme que eternizou o porco aranha na minha cabeça e se você sabe de qual filme eu estou falando, com certeza a música já invadiu a sua também. 

Mas uma cena logo do início do filme diz muito sobre os nossos dias, na cena a família Simpson está na igreja quando o vovó (Abraham Jebediah “Abe”) tem uma experiência espiritual e começa a profetizar dentro da igreja, ao melhor estilo caricato e exagero da série, Homer retira seu pai da igreja enrolado no tapete do corredor, já no carro começam a falar sobre o que iam comer enquanto Marge tentava conversar sobre o que havia acontecido com o vovó, nessa cena ela questiona, 

“Do quê adianta irmos à igreja todos os domingos, se quando alguém tem uma verdadeira experiência religiosa nós ignoramos?”

Marge simpson

Caso você queira assistir a cena, pode fazer isso aqui, essa cena, com as devidas proporções do exagero, resume bem a fé daqueles que não desejam acreditar, pois para quem não deseja o dom da fé, buscar outras explicações é o caminho imediato, como nos apresenta o evangelho de hoje (Lc 11, 14-23) onde aqueles que se recusam a acreditar na autoridade de Deus, atribuem as obras de Cristo ao demônio. Nos nossos dias, o chamado benefício da dúvida ou o ateísmo praticante nos faz simplesmente ignorar o que acontece a nossa volta como uma espécie de solução evidente que todos os inteligentes deveriam adotar. 

Na terça-feira passada, 09 de março de 21, eu saí para caminhar, como sempre caminho sozinho eu tenho o hábito de iniciar rezando a oração do Santo Anjo e literalmente o convidando para meditar os mistérios do Santo Terço comigo, então saio andando rezando o Santo Terço. Nesse dia não foi diferente eu cruzei a ponte andando enquanto rezava e na volta já tinha terminado o terço, eu liguei o fone de ouvido e vinha contemplando a vista quando olhando para frente eu vi um homem quem vinha de bicicleta no sentido contrário do meu. 

Eu assistir, a uma distância de uns 30 metros, o homem perder o controle da bicicleta e cair do passeio da ponte para a via dos carros batendo a cabeça na proteção de concreto, embora a altura não fosse grande, cerca de um metro, na velocidade que ele vinha e sem nenhum equipamento de proteção ele caiu e não conseguiu se levantar. 

Eu levei cerca de cinco segundos para realmente entender o que tinha acontecido e vendo o homem caído na via da ponte comecei a correr na direção dele sinalizando para os carros a fim de evitar que ele fosse atropelado. Do outro lado, vindo pela via contrária, alguns ciclistas estavam subindo e vendo o homem no chão pararam para ajudar e tentaram sinalizar para evitar o mesmo. 

O homem estava banhado em seu próprio sangue e nós não tínhamos muito a fazer, não tínhamos celular para ligar para a emergência, não tínhamos como sequer tentar parar o sangramento. Em meio aquela situação eu olhei para o céu, que estava estrelado naquele dia e pensei, 

“Sei que Você está aí? Precisamos de ajudar.”

E baixando a cabeça fui tentar acalmar o homem que ainda estava consciente, mas é como está escrito,

“A oração dos humildes penetra nas nuvens; ele não se consolará, enquanto ela não chegar a Deus, e não se afastará, enquanto o Altíssimo não puser nela os olhos.”

(Eclo 35,21).

Cerca de um minuto depois, um comboio de ciclistas que vinha subindo a ponte nos avistou e parando, travessaram para o nosso lado da ponte para ajudar, entre os ciclistas havia um médico, uma enfermeira e dois técnicos de enfermagem. Eles sabiam o que estavam fazendo e aquele homem estava em boas mãos, mas infelizmente em mãos vazias, pois naquele lugar não tinham nenhum tipo de material ou equipamento que pudesse ser utilizado para prestar os primeiros socorros.

Um outro homem que voltava do trabalho parou pediu licença a mulher que estava parada do lado dele e retirou a própria camisa e a cedeu para que fosse usada para apoiar a cabeça ensanguentada do homem, naquele momento eu imaginei Jesus ali no chão, ferido, tendo seu rosto ensanguentado sendo limpo com uma camisa. Já tínhamos celulares para ligar para emergência e a enfermeira disse que ele precisava urgente de atendimento porque ele estava perdendo muito sangue, não podia fazer nada além de rezar e colocando a mão no bolso senti minha dezena de cordinha, que uso para rezar quando saio para andar. Lembrei daquele que sempre está ao meu lado e que a pouco mais de uma hora atrás eu tinha convidado a meditar os mistérios do santo terço comigo e pensei, 

“É da vontade do Pai que esse homem morra aqui? Se não for, faz alguma coisa por ele”. 

E comecei a rezar a oração do Santo Anjo, ao que parece, não era à vontade Pai, pois antes que eu terminasse a oração (que sabemos ser bem curta) uma viatura do corpo de bombeiros, que retornava para base para entregar equipamentos, passou por nós e dificilmente não perceberia mais de dez pessoas paradas no meio da ponte gritando e fazendo sinal para que ela parasse. A viatura repleta de material tinha o que era preciso para prestar aquele homem os primeiros socorros necessários e o capitão do corpo de bombeiros que estava na viatura, ligou solicitando que uma ambulância de resgate do corpo de bombeiros o buscasse.

Com o homem já na ambulância e os ânimos acalmados, nos restava os pertences daquele homem, até então um verdadeiro sem nome no caminho, conseguimos com a ajuda dele identificar seus familiares e ligar para eles para que alguém pudesse vir buscar suas coisas (uma mala de couro, uma bolsa, uma bicicleta e alguns coisas menores), a ambulância seguiu para o hospital, o comboio de ciclistas seguiu seu caminho, no meio da ponte às 21:40h ficamos um senhor que se ofereceu para esperar que algum familiar aparecesse para pegar as coisas e eu que fiquei fazendo companhia a ele, até que seu genro apareceu para pegar as coisas daquele homem. 

Eu o acompanhei pelo caminho e conversamos um pouco, foi assim que descobrir que aquele homem sem nome que ajudamos, era um bom pai que vinha da casa das filhas que acabara de visitar e levar presentes pois era aniversário de uma delas, um bom sogro que havia deixado certa quantia em dinheiro para ajudar no sustendo da casa pois seu genro estava desempregado, um bom esposo que mesmo separado da mulher ainda se preocupada com ela e tinha marcado de voltar durante a semana para realizar concertos na casa pois ela estava impossibilitada de fazer e também um bom filho que tinha pegado uma mala de couro emprestado para ir visitar o pai adoentado no interior no final de semana. 

Esse era o nosso homem a beira do caminho, um homem como outro qualquer, uma pessoa que com suas poucas palavras, banhado em sangue e agonia relembrou a todos nós naquela noite algumas lições valiosas sobre a vida, nos fez reviver o evangelho da parábola do bom samaritano (Lc 10, 30) pelas mãos de muitos até o Cristo ensanguentado caído no caminho do Calvário (Mt 27, 31).

Existem muitas maneiras de interpretar os fatos ali vividos, alguns provavelmente vão tratar tudo como coincidências, outros vão dizer que estou exagerando (e talvez esteja um pouco), mas se você não está disposto a olhar e principalmente a viver a sua vida com os olhos da fé, eu volto para a pergunta de Marge Simpsons, 

Para quê você vai a igreja todo domingo? 

Eu prefiro no correr em direção ao outro que cai, no que oferece o que sabe ao auxílio do outro, no que desvia o trânsito, no que sede sua própria roupa, no que desvia o rumo do seu trabalho, no que liga para a emergência, na viatura que passa, no socorro que chega, no que espera sem saber quem esperar, no que mesmo no chão pensa no sustento da família, em todas essas pequenas grandes coisas, eu preferir perceber a ação de Deus. 

Eu prefiro perceber Deus nas pequenas coisas. 

Graça, Paz e Misericórdia. 

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