Depois de Adão dar nome a cada um dos animais, sem encontrar entre eles um capaz de amar, podemos imaginar seu deslumbramento ao ver a mulher. Sua exclamação: “Eis enfim o osso dos meus ossos e a carne da minha carne!” (Gn 2, 3) expressa todo o seu fascínio e admiração. 

Note-se o enfoque no corpo. Adão está fascinado pelo corpo dela, porque, como explica o Papa, este “finalmente” é um corpo que expressa uma pessoa. Todos os animais aos quais deu nome eram corpos, mas não pessoas. Em nosso idioma, essas palavras não dizem muito, mas para os judeus, “carne” e “ossos” significavam o ser humano inteiro. Por isto, a criação da mulher a partir de um osso de Adão (cf. Gn 2, 21-22) é uma forma figurada de expressar que ambos, homem e mulher, participam da mesma humanidade. Ambos são pessoas feitas à imagem de Deus. Ambos estão “sozinhos” no mundo, pois são diferentes dos animais (solidão original); mas ambos são chamados a viver numa aliança de amor. 

“Por isso deixará o homem seu pai e sua mãe e se unirá à sua esposa, e os dois se tornarão uma só carne” (Gn 2, 24). Esta experiência de unidade suplanta a solidão do homem, no sentido de ele estar sozinho sem o “outro”. Mas afirma tudo sobre a solidão humana, no sentido de o homem e a mulher serem pessoas diferentes dos animais. A união humana “numa só carne” está a mundos de distância da copulação dos animais. Qual a grande diferença? Embora, biologicamente, se pareça, a união sexual humana é muito mais do que uma realidade biológica. É também uma realidade espiritual e teológica. O corpo humano revela o mistério espiritual do amor divino e dele participa. Como declara o Catecismo, “no casamento a intimidade corporal dos esposos torna-se um sinal e um penhor de comunhão espiritual” (CIC, n. 2360). Os animais são incapazes dessa “comunhão espiritual” por não serem espirituais. O seu “pó” ou a sua “matéria” carecem de inspiração. Falta-lhes o espírito, pois não foram feitos à imagem de Deus. 

O tornar-se “uma só carne”, repetimos, não consiste apenas na união de dois corpos (como no caso de animais); é “uma expressão ‘sacramental’ que corresponde à comunhão de pessoas” (25.06.1980). Lembre-se aqui o que dissemos sobre a “sacramentalidade” do corpo. Ele torna visível o mistério invisível de Deus, que é em si mesmo uma eterna comunhão de Pessoas; de Deus, que em si mesmo é amor. 

Nesta altura, o Papa faz uma explanação dramática do pensamento católico. Tradicionalmente, o pensamento de muitos teólogos era que nós somos retratos de Deus enquanto indivíduos, mediante nossa alma racional. Não resta dúvida de que isto é verdade. João Paulo II, porém, dá um passo adiante: “O homem torna-se imagem de Deus não tanto no momento da solidão, quanto no da comunhão”. Noutras palavras, ele reflete Deus, “não apenas através de sua própria humanidade, senão também através da comunhão de pessoas, que o homem e a mulher formam desde o começo”. E chega a dizer que isto “constitui, talvez, o aspecto teológico mais profundo de tudo o que se pode falar sobre o homem”. “Sobre tudo isto – observa por fim – desde o começo desceu a bênção da fertilidade” (14.11.1979). 

Deus não podia ter dado uma finalidade e uma dignidade maiores ao amor sexual. Como dissemos há pouco, a união conjugal deve ser um ícone da vida íntima da Trindade! Se pudéssemos assimilar esta verdade e refletir sobre ela, nunca mais encararíamos o sexo do mesmo jeito. Deus – lembre uma vez mais – não é sexual. A imagem terrena empalidece quando comparada com a realidade divina. Deus, no entanto, nos criou homem e mulher e nos chamou à comunhão, como revelação primordial (original, fundamental) de seu próprio mistério no mundo criado. É isto que deseja significar o Papa ao descrever o matrimônio como o “sacramento primordial”. Toda a realidade da vida matrimonial toma-se, naturalmente, um sacramento. Em nenhum lugar, porém, o “grande mistério” se expressa com mais evidência do que no momento em que os dois se tomam “uma só carne”. 

Percebam Deus nos pequenos detalhes.

Graça, Paz e Misericórdia.

Fonte: WEST, C. Teologia do corpo para principiantes: uma introdução básica à revolução sexual por João Paulo II. Madrid: Myrian, 2008.

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