(Jo 21,1-19)

Depois de tudo, Pedro volta a pescar, “vou pescar”, diz ele. E os outros discípulos respondem, “também vamos contigo” (Jo 21,3). É impressionante como o coração humano, mesmo diante de um chamado extraordinário, pode desejar retornar ao que é familiar. Depois da cruz, depois da ressurreição, depois de ter visto o Senhor, Pedro volta ao lago, ao barco, à rede.
Mas por que isso nos surpreende? Quantas vezes, mesmo após vivermos encontros profundos com Deus, nós também voltamos às antigas redes? Aquilo que um dia deixamos, volta a parecer mais fácil, mais conhecido, mais seguro.
Mas é nesse momento, na noite infrutífera, que Jesus aparece na margem, “filhos, tendes alguma coisa para comer?” (Jo 21,5).
É uma pergunta simples, mas profundamente pedagógica. Jesus sabe que não há peixe, mas deseja ouvir da boca deles o reconhecimento do fracasso e só depois disso Ele orienta, “lançai a rede à direita do barco e achareis” (Jo 21,6).
São Gregório Magno interpreta que a rede lançada do lado direito do barco representa a obediência à Palavra de Cristo, pois só quando pescamos conforme o Seu mandamento é que obtemos frutos verdadeiros. Antes disso, as redes da autossuficiência estão sempre vazias.
Eles obedecem, e a rede se enche, nesse momento, como que lembrando-se do que Ele pode fazer, João é quem o reconhece, “é o Senhor!” (Jo 21,7), diz ele a Pedro. E Pedro, ao ouvir isso, se lança ao mar. O mesmo Pedro que já havia andado sobre as águas e afundado, o mesmo Pedro que negou, que chorou, que correu ao túmulo. Agora ele se lança com pressa, porque o amor quando é sincero, ainda que marcado por quedas, não hesita em correr ao reencontro.
Santo Agostinho escreve que a pesca abundante representa a missão da Igreja, que ao obedecer a Cristo lança sua rede no mar do mundo e recolhe não apenas multidões, mas almas destinadas à eternidade. E acrescenta que os 153 grandes peixes mencionados simbolizam a universalidade da salvação, onde há espaço para todos os povos e línguas.
Jesus já está com brasas acesas e peixe sobre elas. Ele não precisa do que pescaram, mas convida, “trazei alguns dos peixes que apanhastes agora” (Jo 21,10), porque o Senhor, ainda que tenha tudo, deseja partilhar conosco a obra da redenção. Ele nos permite colaborar, Ele aceita nossos peixes como aceita nossas orações, nossos esforços, nossas misérias.
Depois da refeição, vem o silêncio cortado por uma pergunta, “Simão, filho de João, tu me amas mais do que estes?” (Jo 21,15). Jesus não chama Pedro de Pedro, chama-o de Simão, filho de João. É como se estivesse devolvendo Pedro à sua origem, à sua humanidade frágil, para fazê-lo renascer de um novo amor. Por três vezes pergunta, três vezes Pedro responde, três vezes Jesus confia a ele uma missão.
São João Crisóstomo reflete que cada pergunta de Jesus corresponde a uma das negações de Pedro, e que a tripla confissão de amor é a cura da sua tripla ferida. Santo Tomás de Aquino acrescenta que o amor aqui professado é condição para o ministério pastoral. Cristo não entrega as ovelhas a quem sabe, mas a quem ama. E é pelo amor que Pedro se torna pastor.
Enquanto o Papa Bento XVI nos explica um jogo de verbos muito significativo realizado por João, ele elucida que em grego o verbo “filéo” expressa o amor de amizade, terno mas não totalizante enquanto o verbo “agapáo” significa o amor sem reservas, total e incondicionado. Jesus pergunta a Pedro pela primeira vez: “Simão… tu amas-Me (agapâs-me)” com este amor total e incondicionado (cf. Jo 21, 15)? Antes da experiência da traição o Apóstolo teria certamente respondido: “Amo-Te (agapô-se) incondicionalmente”. Agora, que conheceu a amarga tristeza da infidelidade, o drama da própria debilidade, diz apenas: “Senhor… tu sabes que sou deveras teu amigo (filô-se), isto é, “amo-te com o meu pobre amor humano”. Cristo insiste: “Simão, tu amas-Me com este amor total que Eu quero?”. E Pedro repete a resposta do seu humilde amor humano: “Kyrie, filô-se”, “Senhor, tu sabes que eu sou deveras teu amigo”. Pela terceira vez Jesus pergunta a Simão: “Fileîs-me?”, “tu amas-Me?”. Simão compreende que para Jesus é suficiente o seu pobre amor, o único de que é capaz, e, contudo, sente-se entristecido porque o Senhor teve que lhe falar daquele modo. Por isso, responde: “Senhor, Tu sabes tudo; Tu bem sabes que eu sou deveras teu amigo! (filô-se)”. Seria para dizer que Jesus se adaptou a Pedro, e não Pedro a Jesus! É precisamente esta adaptação divina que dá esperança ao discípulo, que conheceu o sofrimento da infidelidade, a realizar a missão a ele confiada.
“Apascenta as minhas ovelhas” (Jo 21,15), Jesus não diz “as tuas”, diz “as minhas”, Pedro pastoreará, mas sob a autoridade d’Aquele que é o verdadeiro Bom Pastor. Por fim, o Senhor diz: “Em verdade te digo, quando eras jovem, tu te vestias e ias para onde querias. Quando fores velho, estenderás as mãos e outro te cingirá” (Jo 21,18), Jesus revela a Pedro o tipo de morte com que glorificará a Deus, a cruz que um dia Pedro temeu, agora será o selo de sua fidelidade.
E então, como da primeira vez, Jesus repete, “segue-me” (Jo 21,19), mesmo depois de negar, mesmo depois de errar, Pedro é convidado a seguir novamente, porque o seguimento de Cristo não é uma linha reta. É um recomeço constante.
E você, o que tem feito com a rede? Está pescando do lado certo? Já respondeu às perguntas que Jesus está lhe fazendo? Você O ama mais do que isso tudo? Se a resposta for sim, mesmo com lágrimas, mesmo com vergonha, mesmo com o coração trêmulo, Ele ainda te responde, “segue-me”.
Percebam Deus nos pequenos detalhes.
Graça, Paz e Misericórdia.





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