Perceber Deus nos pequenos detalhes é um exercício contínuo que aos poucos pode nos levar a uma maior maturidade de fé e intimidade com Deus, mas Ele é um Deus ciumento (Ex 20, 5) e sempre nos desafia a percebê-Lo ainda mais. 

Quando criança nós aprendemos a rezar antes das refeições agradecendo a Deus pela refeição, somos ensinados a rezar antes de dormir agradecendo o nosso dia e ao acordar entregando nosso dia a Ele. Coisas simples como essas que muitos de nós podem considerar um desafio nos dias de hoje, que diante de uma bela refeição tem como primeiro impulso fazer um registro para as redes sociais de como comemos bem, é difícil lembrar de agradecer a Deus. 

Como poderíamos lembrar de rezar antes de ir dormir se a maioria de nós não vai mais dormir, apenas apagam com os celulares nas mãos? Como parar um momento ao acordar para entrega o dia nas mãos de Deus, se ao abrir os olhos a primeira coisa que se faz é conferir as notificações na tela do celular?

Se nós não conseguimos lembrar de agradecer a Deus em bons momentos de descanso ou disposição, quando vamos lembrar de falar com Deus? Se você pensou, diante de um sofrimento, você pensou o mesmo que eu. Como diz o ditado popular, 

“Se não é pelo amor, é pela dor.”

Eu sempre agradeço a Deus por não sentir mais a dificuldade que um dia senti em lembrar Dele e perceber sua ação nos pequenos detalhes como antes, (Se você ainda sente essa dificuldade, peça a Ele essa graça, acredite, Ele a concedera.), mas verdade seja dita, não é exatamente um desafio agradecer a Deus por algo que consideramos bom, depois de um tempo se torna apenas uma questão de hábito.  

O mesmo hábito que qualquer um com a mínima iniciação cristã possui de recorrer a Deus quando deseja algo ou quando algo que não agrada acontece, não importa se é algo pouco ou muito relevante, uma forcinha vinda do alto nunca é demais.

Mas e se for preciso mudar seus hábitos e até contrariar seus instintos? 

Eu estava indo em direção ao ponto de ônibus, para chegar no ponto de ônibus eu precisava atravessar uma avenida que estava com o trânsito intenso. Eu pude ver o ônibus que eu intencionava pegar, fiquei inquieto tentando atravessar a avenida para não perder o ônibus, mas o semáforo não abriu para mim a tempo e quando cheguei do outro lado o ônibus já tinha passado. 

Estava muito irritado e reclamando comigo mesmo por ter perdido o ônibus enquanto caminhava até o ponto, por a avenida ser as margens do rio eu fui caminhando, cerca de 100 metros, em direção ao ponto olhando para o rio enquanto reclamava. Tinha uma canoa no rio com três homens dentro que remavam contra a direção da maré, naquele momento eu esqueci da minha reclamação e lembrei da fala de Jesus a Pedro,

“Avança para águas mais profundas” (Lc 5, 4a)

Naquele momento eu observei todos a minha volta, os vendedores ambulantes, os feirantes, as pessoas indo e vindo dos e para os mais variados lugares, foi quando eu deixei a reclamação de lado e me coloquei a conversar com Deus. 

“Obrigado Senhor, por ter sido eu a perder o ônibus, que não tenho hora marcada para chegar ou para sair hoje, obrigado por ser eu que não me prejudicarei em nada em perder esse ônibus no lugar de alguém que tem mais necessidade do que eu de chegar na hora”. 

Ainda estava no meio da conversa com Deus quando outro ônibus chegou em seguida, pelo curto espaço de tempo entre eles, o ônibus estava quase vazio, eu subi, sentei e tive medo, pois lembrei de Jô, mas depois passou e fiquei pensando sobre nossos instintos humanos, sobre a maneira como Deus através da igreja busca nos melhorar e educar até mesmo nossos instintos e tantas vezes sequer percebemos isso acontecendo. 

Quando fazemos jejum ou abstinência, estamos indo de encontro aos nossos instintos deixando de comer quando temos vontade. Quando decidimos não praticar sexo antes do casamento, estamos indo de encontro ao nosso instinto de reprodução natural. Quando realizamos uma vigília e passamos a noite acordados em oração, estamos indo contra o nosso instinto natural de dormir quando temos sono. 

São tantas coisas que a igreja nos propõe não apenas para sofremos ou passarmos vontade, mas para fortalecer nossa mente e nosso espírito, pois se muitas vezes afirmamos que o ser humano é um animal inteligente, um ser pensante, então precisamos agir como tais. Não podemos simplesmente sucumbir aos nossos instintos biológicos mais primitivos, como se fossemos apenas animais como outros quaisquer, pois somos especiais, não apenas seres inteligentes e pensantes, mas seres criados a imagem e semelhança de Deus (Gn 1, 26).

Por isso, mesmo quando não nos agrada o que acontece, precisamos tentar contrariar os nossos instintos e no lugar de reclamar agradecer a Deus, na certeza de que nós não compreendemos o motivo daquilo, mas Ele sim e por isso confiemos nele da maneira como nos ensina Santo Agostinho,

“Deus não permitiria um mal se não soubesse tirar dele um bem maior”.

Busquemos controlar até os nossos mais rotineiros impulsos e instintos, para que possamos nos aproximar na imagem e semelhança de Deus. 

Percebam Deus nos pequenos detalhes, mesmo que esses pequenos detalhes sejam em você. 

Graça, Paz e Misericórdia. 

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