A luxúria é o pecado capital comumente associado ao sexo, mas ela é muito mais do que isso pois o sexo propriamente dito não é um pecado, o pecado da luxúria é desejo passional e egoísta por todo o prazer sensual e material. O pecador entregue a esse pecado é dominado pelas paixões, demonstrando apego desmedido aos prazeres carnais, corrompendo os bons costumes, estando sempre voltado a sexualidade extrema e a sensualidade exagerada. 

Se na terça-feira de ontem foi dia de carnaval, hoje é um dia interessante para refletirmos sobre a luxúria, não sobre a luxúria que essa festa nos oferece, mas sobre a luxúria que temos disponível no resto do ano. 

Nossa geração, segundo um estudo científico, é a que menos faz sexo em comparação a gerações anteriores, isso talvez explique por que somos também a geração mais apelada para sexualidade e para a sensualidade, seja nas músicas, nas danças, na maneira de se vestir, entre outras coisas, talvez tenha validade o dito popular que tanto meu avô dizia, 

“Homem sério não fica falando do que faz, apenas faz. Quem fica falando demais não é homem, é cabra safado”.

Meu avô faleceu a mais de cinco anos, mas ainda são válidas as palavras dele para as minhas amigas que detestam quando seus companheiros falam do que fazem, imagina os que falam do que não fazem. O primeiro sinal de desequilíbrio em um relacionamento é quando um dos dois não sabe preservar a privacidade do casal, então se você passa por isso no namoro repense ou termine logo esse namoro porque ele não é um namoro santo, mas se você está casado e faz isso, tome vergonha nessa sua cara e como diria meu avô, deixa de ser cabra safado.

Hoje tem início o tempo quaresmal, é um bom momento para repensarmos a presença da luxúria na nossa vida cotidiana, mas para isso precisamos ir um pouquinho além do obvio, precisamos avançar para águas mais profundas (Lc 5, 4b). Nós entendemos o mundo a nosso volta através dos nossos sentidos e assim sendo, somos reflexo do que vemos, do que sentimos, do que provamos, do que ouvimos e do que tocamos. 

Se você deseja aprender a falar um novo idioma, qualquer professor vai lhe dizer que você precisa ter contato com a língua, seja ela falada ou escrita, mas quando você conhecer as palavras sentirá que isso por si só não basta, você precisará conhecer também a cultura dos povos que falam aquela língua, o que eles comem, o que eles vestem, o que eles produzem, seu folclore e suas crenças, é um mar de conhecimento no qual você se aprofunda para de fato sentir-se fluente no novo idioma. 

Assim é para qualquer coisa, ao passar anos na faculdade fazendo um curso, você sai de lá muito mais do que com as disciplinas cumpridas. Ao concluir a graduação você tem uma serie de conhecimentos que não estão presentes diretamente no seu currículo, mas fazem parte da profissão, seus amigos de profissão, o entendimento das especificidades do mercado onde você vai atuar e tantas outras coisas que não foram diretamente ensinadas a você, mas você percebe que sabe no seu dia a dia. 

Assim fomos sendo inseridos na luxúria, enquanto vejo alguns em um debate perdido sobre se a modéstia é ou não uma moda ultrapassada da igreja, ou pior, vejo os próprios defensores da modéstia debatendo se dá para uma mulher viver a modéstia usando calça ou se precisa ser saia e vestido. Peço desculpas meus amigos, mas tenho a sensação de que vocês estão parados em um ponto de ônibus desativado esperando uma linha que não existe mais, digo isso não para dizer que a modéstia acabou, tão pouco para dizer qual a maneira certa ou errada de se viver a modéstia. 

Mas enquanto perdemos tempo com brigas tolas sobre se é moderno ou antigo ou sobre que tipo de roupa combina mais, já precisei incontáveis vezes, na época em que fui coordenador de catequese na iniciação cristã, orientar madrinhas com idade suficiente para serem minha mãe que era necessário respeito na casa de Deus, que evitassem roupas escandalosas no momento do batizado ou da unção do crisma. Não diferente disso, por incontáveis vezes precisei também orientar padrinhos com idade suficiente para serem meu pai de que o momento do sacramento era um momento sagrado e que eles deveriam evitar o consumo de álcool e reservar a possível comemoração para depois da celebração para não chegarem embriagados na casa de Deus. Essas são evidências de que enquanto perdíamos tempo com debates infrutíferos, o pecado acabou entrando na igreja como algo normal e até considerado engraçado. 

A luxúria foi sendo inserida em nosso cotidiano e sendo normalizada como algo banal, destorcendo nossos valores e corroendo o respeito para com o sagrado, estamos imersos de músicas que elevam o sexo desregrado, ridicularizam a castidade enquanto elevam a promiscuidade, desvalorizam e tornam descartável o sacramento do matrimonio, nossos filmes, séries, novelas, programas de TV de todos os tipos acabam no geral fazendo o mesmo. Sim, eu sei, isso não é novo, mas pesquisa aí, dá uma olhada na programação das três principais redes de TVs na maioria dos países do mundo e compara o que era oferecido a vinte anos atrás, a dez anos atrás e o hoje, verá que fomos sendo inseridos gradativamente na luxúria como normal.

Observe suas próprias roupas, as roupas das pessoas a sua volta, a moda popular no geral abandonou o conforto em nome da sensualidade, você pode dizer que as roupas ficaram mais bonitas e eu em determinado grau vou concordar, mas vou pedir novamente, pesquisa aí, veja a evolução do designer dos telefones celulares, dos carros, das casas, dos computadores, dos móveis, dos eletrodomésticos, até das embalagens dos alimentos, você vai perceber uma coisa em comum, de maneira geral elas mudaram para ficarem mais usuais, mais práticas, mais agradáveis, mais econômicas, mais sustentáveis.

Agora faça o mesmo com as roupas, no geral elas ficaram mais rápidas de vestir, porque quase não se tem tecido nelas (risos) e antes que você defenda que no Brasil o clima é diferente do clima europeu e por isso não se usa mais as roupas que ficaram populares na idade média europeia, permita-me lhe dizer duas coisa. Primeira, na Europa as roupas sofreram as mesmas mudanças que sofreram aqui. Segunda, na Europa os verões também são quentes, não é porque no continente europeu é frio que não faz calor no verão. 

Mas essa rapidez de vestir tem um contra senso, você pode fazer o contorcionismo argumentativo que desejar, mas a verdade é que muitas dessas peças tem os mesmos objetivos, destacar, sensualizar e sexualizar o corpo, pois sejamos sinceros conosco, confortáveis elas não, apertam, marcam, irritam e isso não afirmo sozinho, é uma pesquisa que fiz com 56 mulheres e 30 homens de diferentes idades que usam em graus diferentes esses tipos de roupa. Mas tal qual um viciado em drogas que sabe que aquela substância está destruindo sua vida e mesmo assim não consegue largar, estamos nós vestindo coisa que muitas vezes não gostamos e não nos deixa bem, o motivo está tão pulverizado no nosso dia a dia que muitas vezes não somos capazes de identificar. 

Por não sermos capazes de identificar, buscamos a culpa em nós mesmos, pois os lindos atores e atrizes dos programas que consumimos atraem nossos olhares para seus corpos, enquanto as músicas que nos embalam nos dizem para fazer coisas que na verdade não deveríamos, nos mandam valorizar coisas que não tem valor e desvalorizar as que tem. Para isso vestimos o que não nos agrada e a culpa de quem será? Nossa, ficamos aprisionados na frente do espelho e em cima da balança, numa cultura de adoração ao próprio corpo que não está perfeito como o de todo o conteúdo que consumimos, por isso não sentimos a felicidade que nos disseram que sentiríamos ao fazer as coisas que nos convenceram que era normal fazer e ao vestir as roupas que nos fizeram acreditar que era legal vestir. 

As luxúrias descontroladas do carnaval são fáceis de evitar, porque elas são muito evidentes, mas no nosso dia a dia o pecado está sempre a espreita nos tirando do caminho, nos inserindo em sua normalidade onde tudo pode haver um depende, um porém, são detalhes que vão fazendo com que deixemos de ouvir a voz de Deus e quando percebemos estamos, não mais parados no ponto de ônibus desativado esperando uma linha que não existe mais, já estamos dentro de um metrô expresso, que nos leva direto para longe de Deus.

Mas nem tudo está perdido, ainda há tempo de olharmos pela janela da nossa alma e entendermos que embora o metrô seja expresso, Deus nos dá várias estações onde podemos saltar e ir de encontro a Ele, a quaresma é mais um dessas estações, só precisamos de coragem para saltar do metrô com ele em movimento e confiar que Deus é uma presença verdadeiramente onipresente em nossas vidas e que ao se jogar Nele, enfrentaremos o pecado até nos menores detalhes. 

Percebam Deus nos pequenos detalhes. 

Graça, Paz e Misericórdia.

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