Uma das coisas que mais me preocupa ao mesmo tempo que me fascina em Deus é a maneira como Ele em seu amor nos mantém livres. Ao ler os evangelhos é fácil perceber como Jesus sempre nos conduz a liberdade e permite nossa livre iniciativa e a liturgia dessa quarta-feira da Semana Santa nos lembra bem disso, ao nos apresentar com a narrativa da Santa Ceia do evangelho segundo Matheus (Mt 26,14-25).

Esse momento sempre me chama atenção por três motivos:

Primeiro, porque o evangelista faz questão de dizer que Jesus fala aos apóstolos sobre a traição que iria sofrer enquanto comiam (Mt 26, 21), na naturalidade de um ato humano comum, todos nós nos alimentamos todos os dias e com a mesma naturalidade que comemos traímos a Jesus diariamente. Como nos ensina o ato de contrição, com pensamentos, seja ímpeto da gula de querer por mais comida do que realmente precisamos no prato ou na falta de caridade de querer por comida primeiro para escolher daí a melhor parte sem pensar no próximo. Com palavras, onde tantas vezes não reconhecemos o esforço de quem prepara o alimento e criticamos a comida, imitando o povo ingrato no deserto rechaçamos o alimento que a nós é oferecido (Ex 16). Com atos, muitas vezes consequências de pensamentos e ações como estes, desperdiçamos o alimento que temos e cada vez nos perdemos mais em nossa fartura (Lc 16, 19 – 31). E com omissões, estas frequentes entre nós onde se torna cada vez mais raro lembrar de agradecer o alimento que temos, agindo de tal maneira retiramos Jesus de nossas mesas, deixando-O longe de nossas ceias.

Segundo, porque o evangelista mais uma vez destacando uma natural característica humana, afirma que os apóstolos ficaram muito tristes e começam a perguntar “Senhor, será que sou eu?” (Mt 26, 22b). Essa é a realidade da maioria de nós cristãos, não planejamos deliberadamente virar as costas para Jesus, não acordamos com planos de traí-Lo, mas sabemos que isso pode acontecer, isso é humildade, apenas um tolo acredita que é imune ao pecado e que não corre o risco de cair, mas o sábio que busca a santidade sabe que Jesus o conhece mais do que ele mesmo, os apóstolos sabiam disso e daí a tristeza, a tristeza de pensar que entre eles alguém cairia em pecado. Essa é a essência da verdadeira Igreja de Cristo, se um membro do corpo padece, todo o corpo sente o pesar. Diferente do que aconteceu com Adão e Eva que diante de Deus trocaram acusações e ficaram buscando culpados (Gn 3, 12 – 13), os apóstolos acusam individualmente a eles mesmo, nenhum aponta para o outro, apenas para si próprios e com isso temos muito a aprender sobre como viver a fé em nossas paróquias.

Terceiro, a narrativa continua com Jesus a dar oportunidade a Judas, que aparentemente é o último a perguntar se seria ele, tal qual como nós que precisamos nos reconciliar com Deus na confissão e temos dificuldade de falar nossos pecados, o evangelista nos deixa um indício do convite de Jesus para que Judas se reaproxime dizendo que aquele que O trairá é quem com Ele põem a mão no prato e alerta a todos, “Contudo, ai daquele que trair o Filho do Homem! Seria melhor que nunca tivesse nascido!” (Mt 26, 24b), o evangelista deixa claro que não era apenas para Judas aquele aviso. Pois se nós mesmo convidados a estar com Ele no sacramento do batismo, a estar junto e dividir a mesma mesa pelo sacramento da reconciliação, o mesmo prato pelo sacramento da comunhão, continuamos sempre a planejar traí-Lo, era melhor que não tivéssemos nascido.

Por isso a mesma liberdade que nos permite está com Ele também pode ser a liberdade que Dele nos afasta, pois enquanto estamos nessa jornada terrena Jesus não nos condena, espera de nós uma confissão sincera para nos acolher em sua misericórdia, pois a resposta de Jesus a fala de Judas foi “Tu o dizes” (Mt 26, 25b), o que estamos dizendo a Jesus com nossas vidas?

Percebam Deus nos pequenos detalhes.

Graça, Paz e Misericórdia.

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